Rosa Maria Bueno Fischer
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação "O que a filosofia da visão ensina à filosofia? Que ver não é pensar e pensar não é ver, mas que sem a visão não podemos pensar, que o pensamento nasce da sublimação do sensível no corpo glorioso da palavra que configura campos de sentido a que damos o nome de idéias. Que o pensamento não são enunciados, juízos, proposições, mas afastamentos determinados no interior do Ser. Que não é contato invisível de si, interioridade transparente e presença a si, mas excentricidade perante nós a partir de nós, “estrelas de Van Gogh” e espinhos em nossa carne. Que o conceito não é representação completamente determinada, mas “generalidade de horizonte” e a idéia não é essência, significação completa sem data e sem lugar, mas “eixo de equivalências”, constelação provisória e aberta do sentido. Ensina que, assim como o visível é atapetado pelo forro do invisível,
também o pensado é habitado pelo impensado". Chaui, 1999, p. 60-61
também o pensado é habitado pelo impensado". Chaui, 1999, p. 60-61
O belíssimo texto de Marilena Chaui, “Janela da alma, espelho do mundo”, serve de mote para este artigo, tendo em vista que sintetiza, poética e filosoficamente, algumas das várias problematizações que pretendo fazer aqui, a respeito das pesquisas em educação que têm como objeto ou como material empírico as imagens da televisão ou as diferentes formas de veicular e receber produtos da mídia televisiva. Pergunto-me: como estudar as imagens, textos e sons da mídia, especialmente da televisão, tendo como pressuposto que não extrairemos das imagens representações acabadas, mas antes possibilidades de significação, datadas e bem localizadas, seja do de vista daqueles que as produziram e colocaram em circulação, seja do ponto de vista daqueles que a receberam e, com ela, de alguma forma, interagiram?
Como o analista das imagens da mídia tratará o fato de ele mesmo ser alguém que especta, que olha, que investe seu corpo nesse jogo de interioridade e de exterioridade que diz respeito ao ato de ver, de receber imagens e de operar sobre elas – como espectador comum do cotidiano e, simultaneamente, como estudioso das questões da comunicação no âmbito da pesquisa educacional? Finalmente, de que modo, ao investirmos nos estudos sobre televisão, efetivamente participamos de uma elaboração da história do presente, já que as imagens que nos ocupam são de alguma forma “espinhos em nossa carne”?
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Pesquisar, ou: problematizar o presente
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Defendo aqui uma posição que espero ter explicitado suficientemente: nossas análises dos meios de comunicação e informação, no espaço das pesquisas educacionais, estão a exigir, nestes tempos que vivemos, articulações mais densas e comprometidas com a própria complexidade dos processos comunicacionais. A meu ver, como procurei demonstrar neste artigo, uma possibilidade é a de investirmos na análise do discurso dos textos midiáticos sem perder de vista, de algum modo, aquilo que diz respeito aos modos e “exercícios do ver”20 dos diferentes públicos. No entanto, mais importante do que isso, a proposta é que tais investigações sobre produtos midiáticos e seus públicos sejam tecidas a partir de uma genuína preocupação com a história do presente, com atenção naquilo que hoje se faz urgente pensar – aceitando que “o visível é atapetado pelo forro do invisível”, e que “também o pensado é habitado pelo impensado” (Chaui 1999, p. 61). Nesse sentido, imagino que o esforço estará em mergulhar sem medo nossos estudos em teorias que dialogam com os “perigos” contemporâneos, como escreve Foucault (1995, p. 256), sem procurar propriamente alternativas, mas incessantemente trabalhar com problematizações, já que, ao fim e ao cabo, tudo é mesmo muito perigoso.
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ROSA MARIA BUENO FISCHER é professora adjunta do Departamento de Estudos Especializados e do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Como pesquisadora, trabalha com a temática das relações entre mídia, cultura, discurso, modos de subjetivação e educação. Durante dez anos trabalhou na TV Educativa do Rio de Janeiro, como coordenadora de programas para crianças, adolescentes e professores. É autora dos livros O mito na sala de jantar (Movimento, 1993, 2ª ed.) e Televisão & educação; fruir e pensar a TV (Autêntica, 2001). Publicou também vários artigos em revistas especializadas, além de ensaios e capítulos de livros, sobre os temas de suas pesquisas. Desde 1997 é editora da revista Educação & Realidade, da Faculdade de Educação da UFRGS. Participou, de 1998 até 2000, do Comitê Científico da ANPEd.
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